Банкир-анархист и другие рассказы
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Молодой человек со старческой бородой остановился на краю тротуара, словно на пристани, посмотрел на торговку отсутствующим взглядом и с грустью произнес:
— Сразу видно, что тебя бабка родила!
Торговка застыла, как вкопанная, покраснела, на несколько секунд умолкла — а вокруг, спустя мгновение, уже расходившаяся публика взорвалась хохотом. И было неясно, смеялась ли она над ответом или же над немым смущением светловолосой торговки.
Молодой человек двинулся дальше, гордо вскинув бороду и оставив позади аплодирующую публику. Позже, в кафе он рассказал о том, что случилось, своему другу. Тот выслушал, рассмеялся, но затем замолчал. В
— Извините меня. Возможно, я глуп или покажусь таковым сегодня. Но что все это значит?
— А ничего не значит. В этом и есть вся соль.
Мораль:
Смутить — значит победить.
Перевод АННЫ ХУСНУТДИНОВОЙ
Fernando Pessoa
O BANQUEIRO ANARQUISTA Е OUTROS CONTOS
O banqueiro anarquista
T'inhamos acabado de jantar. Defronte de rnim o meu amigo, banqueiro, grande comerciante e acambarcador not'avel, fumava como quem n~ao pensa. A conversa, que fora amortecendo, jazia morta entre n'os. Procurei reanim'a-la, ao acaso, servindome de uma ideia que me passou pela meditac~ao. Voltei-me para ele, sorrindo.
— 'E verdade: disseram-me h'a dias que voc^e em tempos foi anarquista…
— Fui, n~ao: fui e sou. N~ao mudei a esse respeito. Sou anarquista.
— Essa 'e boa! Voc^e anarquista! Em que 'e que voc^e 'e anarquista?… S'o se voc^e d'a `a palavra qualquer sentido diferente…
— Do vulgar? N~ao; n~ao dou. Emprego a palavra no sentido vulgar.
— Quer voc^e dizer, ent~ao, que 'e anarquista exactamente no mesmo sentido em que s~ao anarquistas esses tipos das organizac~oes oper'arias? Ent~ao entre voc^e e esses tipos da bomba e dos sindicatos n~ao h'a diferenca nenhuma?
— Diferenca, diferenca, h'a… Evidentemente que h'a diferenca. Mas n~ao 'e a que voc^e julga. Voc^e duvida talvez que as minhas teor'ias sociais sejam iguais `as deles?…
— Ah, j'a percebo! Voc^e, quanto `as teor'ias, 'e anarquista; quanto `a pr'atica…
— Quanto `a pr'atica sou t~ao anarquista como quanto `as teor'ias. E quanto `a pr'atica sou mais, sou muito mais anarquista que esses tipos que voc^e citou. Toda a inha vida o mostra.
— Hem?
— Toda a minha vida o mostra, filho. Voc^e 'e que nunca deu a estas coisas uma atentc~ao l'ucida. Por isso lhe parece que estou dizendo uma asneira, ou ent~ao que estou brincando consigo.
— 'O homem, eu n~ao percebo nada!.. A n~ao ser…, a n~ao ser que voc^e julgue a sua vida dissolvente e anti-social e d^e esse sentido ao anarquismo…
— J'a lhe disse que n~ao — isto 'e, j'a lhe disse que n~ao dou `a palavra anarquismo um sentido diferente do vulgar.
— Est'a bem… Continuo sem perceber… 'O homem, voc^e quer-me dizer que n~ao h'a diferenca entre as suas teor'ias verdaderamente anarquistas e a pr'atica da sua vida — a pr'atica da sua vida como ela 'e agora? Voc^e quer que eu acredite que voc^e tem uma vida exactamente igual `a dos tipos que vulgarmente s~ao anarquistas?
— N~ao; n~ao 'e isso. O que eu quero dizer 'e que entre as minhas teor'ias e a pr'atica da minha vida n~ao h'a diverg^encia nenhuma, mas uma conformidade absoluta. L'a que n~ao tenho uma vida como a dos tipos dos sindicatos e das bombas — isso 'e verdade. Mas 'e a vida deles que est'a fora do anarquismo, fora dos ide'ais deles. A minha n~ao. Em mim — sim, e mim, banqueiro, grande comerciante, acambarcador se voc^e quiser —, em mim a teoria e a pr'atica do anarquismo est~ao conjuntas e ambas certas. Voc^e comparou-me a esses parvos dos sindicatos e das bombas para indicar que sou diferente deles. Sou, mas a diferenca 'e esta: eles (sim, eles e n~ao eu) s~ao anarquistas s'o na teoria; eu sou-o na teoria e na pr'atica. Eles s~ao anarquistas e est'upidos, eu anarquista e inteligente. Isto 'e, meu velho, eu 'e que sou o verdadeiro anarquista. Eles — os dos sindicatos e das bombas (eu tamb'em l'a estive e sa'i de l'a exactamente pelo meu verdadeiro anarquismo) —, eles s~ao o lixo do anarquismo, os f^emeas da grande doutrina libert'aria.
— Essa nem ao diabo a ouviram! Isso 'e espantoso! Mas como concilia voc^e a sua vida — quero dizer a sua vida banc'aria e comercial — com as teor'ias anarquistas? Como o concilia voc^e, se diz que por teor'ias anarquistas entende exactamente o que os anarquistas vulgares entendem? E voc^e, ainda por cima, me diz que 'e diferente deles por ser mais anarquista do que eles — n~ao 'e verdade?
— Exactamente.
— N~ao percebo nada.
— Mas voc^e tem empenho em perceber?
— Todo o empenho.
Ele tirou da boca o charuto, que se apagara: reacendeuo lentamente; fitou o f'osforo que se extingu'ia; dep^o-lo ao de leve no cinzeiro; depois, erguendo a cabeca, um momento abaixada, disse:
— Oica. Eu nasci do povo e na classe oper'aria da cidade. De bom n~ao herdei, como pode imaginar, nem a condic~ao, nem as circunst^ancias. Apenas me aconteceu ter uma intelig^encia naturalmente l'ucida e uma vontade um tanto ou quanto forte. Mas esses eram dons naturais, que o meu baixo nascimento me n~ao podia tirar.
«Fui oper'ario, trabalhei, vivi uma vida apertada; fui, em resumo, o que a maiora da gente 'e naquele meio. N~ao digo que absolutamente passasse fome, mas andei l'a perto. De resto, podia t^e-la passado, que isso n~ao alterava nada do que se seguiu, ou do que lhe vou expor, nem do que foi a minha vida, nem do que ela 'e agora.
«Fui um oper'ario vulgar, em suma; como todos, trabalhava porque tinha que trabalhar, e trabalhava o menos poss'ivel. O que eu era, era inteligente. Sempre que podia, lia coisas, discut'ia coisas e, como n~ao era tolo, nasceu-me uma grande insatisfac~ao e uma grande revolta contra o meu destino e contra as condic~oes sociais que o faziam assim. J'a lhe disse que, em boa verdade, o meu destino podia ter sido pior do que era; mas naquela altura parecia-me a mim que eu era um ente a quem a Sorte tinha feito todas as injusticas juntas, e que se tinha servido das convenc~oes sociais para mas fazer. Isto era a'i pelos meus vinte anos — vinte e um m'aximo — que foi quando me tornei anarquista.