Банкир-анархист и другие рассказы
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«Meu caro Bastos…», disse eu.
«S'o BERRYLOID», respondeu o Bastos, virando-me as costas.
«Eu quer'ia agradecer…», prossegui.
«Traga o carro», disse o Bastos.
Levei-lhe o carro e ele pintou-o a BERRYLOID. E n~ao h'a camurca, nem chuva, nem poeira da pior estrada, que consiga envergonhar esse esmalte de aco. Sim: o Bastos tratou-me mal, mas tratou bem a verdade. N~ao h'a nada como o BERRYLOID.
…Tanto assim que, quando comprei o meu segundo carro, tratei logo de saber se ele vinha j'a pintado a BERRYLOID. Ele a'i est'a na base da p'agina e no fim da minha hist'oria. Passa-se a camurca, mas 'e preciso usar 'oculos fumados: o brilho deslumbra. E, o que 'e mais, deslumbrar'a, porque dura.
A minha camurca dura eternamente. O que se tem gasto muito s~ao os 'oculos fumados; e os elogios dos amigos que v^eem os meus carros pintados a BERRYLOID.
Um grande portugu^es ou A origem do conto do vig'ario
Viv'ia, h'a j'a n~ao poucos anos, algures num concelho do Ribatejo, um pequeno lavrador, e negociante de gado, chamado Manuel Peres Vig'ario.
Da sua qualidade, como diriam os psic'ologos pr'aticos, falar'a o bastante a circunst^ancia que d'a princ'ipio a esta narrativa.
Chegou uma vez ao p'e dele certo fabricante ilegal de notas falsas, e disse-lhe:
Sucedeu que dali a d'ias tinha o Vig'ario que pagar a uns irm~aos, negociantes de gado como ele, a diferenca de uma conta, no valor certo de um conto de r'eis. No primeiro dia da feira, em a qual se deveria efectuar o pagamento, estavam os dois irm~aos jantando numa taberna escura da localidade, quando surgiu pela porta, cambaleante de b^ebado, o Manuel Peres Vig'ario. Sentou-se `a mesa deles, e pediu vinho. Da'i a um tempo, depois de v'aria conversa, pouco intelig'ivel da sua parte, lembrou que tinha que tinha que pagar-lhes. E, puxando da carteira, perguntou se se importavam de receber tudo em notas de cinquenta mil r'eis. Eles disseram que n~ao; e, como a carteira nesse momento se entreabrisse, o mais vigilante dos dois chamou, com um olhar r'apido, a atenc~ao do irm'ao para as notas, que se via eram de cem.
Houve ent~ao a troca de outro olhar.
O Manuel Peres, com lentid~ao, contou tr'emulamente vinte notas, que entregou. Um dos irm~aos guardou-as logo, tendo-as visto contar, nem se perdeu em olhar mais para elas. O Vig'ario continuou a conversar, e, v'arias vezes, pediu e bebeu mais vinho. Depois, por natural efeito da bebedeira progressiva, disse que queria ter um recibo. N~ao era uso, mas nenhum dos irm~aos fez quest~ao. Ditava ele o recibo, disse, pois queria as coisas todas certas. E ditou o recibo — em recibo de b^ebado, redundante e absurdo: de como em tal dia, a tais horas, na taberna de fulano, «estando n'os a jantar» (e por ali fora com toda a prolixidade frouxa do b^ebado…), tinham eles recebido de Manuel Peres Vig'ario, do lugar de qualquer coisa, em pagamento de n~ao sei qu^e, a quantia de um conto de r'eis em notas de cinquenta mil r'eis. O recibo foi datado, foi selado, foi assinado. O Vig'ario meteu-o na carteira, demorou-se mais um pouco, bebeu ainda mais vinho, e da'i a um tempo foi-se embora.
Quando, no pr'oprio dia ou no outro, houve ocasi~ao de se trocar a primeira nota, o que ia a receb^e-la devolveu-a logo, por escarradamente falsa, e o mesmo fez `a segunda e `a terceira… E os irm~aos, olhando ent~ao verdadeiramente para as notas, viram que nem a cegos se poderiam passar.
Queixaram-se `a pol'icia, e foi chamado o Manuel Peres, que, ouvindo at'onito o caso, ergueu as m~aos ao c'eu em gracas da bebedeira providencial que o havia colhido no dia do pagamento. Sem isso, disse, talvez, embora inocente, estivesse perdido.
Se n~ao fosse ela, explicou, nem pedida recibo, nem com certeza o pedir'ia como aquele que tinha, e apresentou, assinado pelos dois irm~aos, e que provava bem que tinha feito o pagamento em notas de cinquenta mil r'eis.
O caso, por'em, n~ao p^ode ficar secreto; pouco a pouco se espalhou. E a hist'oria do «conto de r'eis do Manuel Vig'ario» passou, abreviada em «o conto do Vig'ario», para a imortalidade quotidiana, esquecida j'a da sua admir'avel origem.
Os imperfeit'issimos imitadores, pessoais como pol'iticos, do Mestre ribatejano nunca chegaram, que eu saiba, a qualquer simulacro digno do estratagema exemplar. Por isso 'e com ternura que relembro o feito deste grande portugu^es, e me figuro, em devaneio, que, se h'a um c'eu para os h'abeis, como constou que o havia para os bons, ali lhe n~ao deve ter faltado o acolhimento dos pr'oprios grandes mestres da Realidade — nem um leve brilho de olhos de Machiavelli ou Guicciardini, nem um sorriso moment'aneo de George Savile, Marqu^es de Halifax.
Maridos
A gente cria o costume e gosta mais por costume que por outra coisa. Que outra coisa 'e que podia ser. Depois, a gente afeicoa-se, mas afeicoa-se j'a doutra maneira, e s~ao uns filhos grandes que casam connosco.
Outros acham que a gente h'a-de gostar deles por isto ou por aquilo. Ora! A gente nem sabe porque gosta. Depois de gostar diz que gosta por isto ou por isto ou por aquilo, mas 'e s'o depois de gostar. Mas julgam que a gente gosta deles por serem fortes, ou por serem bonitos, ou por terem olhos azuis, ou qualquer coisa assim. 'E um pouco de tudo isso, senhor juiz, e n~ao 'e nada disso.
As mulheres s'erias a valer t^em um 'odio doido `as putas. Julga o merit'issimo juiz que 'e por serem s'erias? 'E, mas 'e por verem de que 'e que est~ao privadas por serem s'erias. Esta 'e a verdade —, senhor juiz — e o mais — n~ao faco o gesto por respeito.
N~ao h'a mulher nenhuma neste mundo — nem a mais s'eria, senhor juiz — que n~ao tenha invejado essas que l'a andam nas ruas `a procura dos homens — nenhuma, senhor juiz, se dissesse a verdade como a p^or o corac~ao ai em cima dessa mesa.